17.11.03

De Erik Satie

"Aquilo que sou"

Toda gente vos dirá que não sou músico. E é verdade.
Desde o início da minha carreira me classifiquei entre os fonometrógrafos. Os meus trabalhos são pura fonométrica. Agarre-se no Filho das Estrelas ou nos Trechos em Forma de Pêra, no Fato de Cavalo ou nas Sarabandas, e descobrir-se-á que nenhuma idéia musical presidiu a criação de tais obras. O que lá domina é o pensamento científico.
De resto, mais prazer sinto a medir um som do que a ouví-lo. De fonómetro em punho, trabalho com alegria e segurança.
O que não terei já pesado e medido? Todo o Beethoven, todo o Verdi, etc. É muito curioso.
Da primeira vez que me servi de um fonoscópio, examinei um si bemol de tamanho médio. Nunca deparei, posso garantir-vos, com uma coisa mais repugnante. Até chamei o criado para ele ver.
Com o fono-pesador um fá sustenido vulgar, como tantos há, atingiu os 93 quilogramas. Saía de um muito gordo tenor que também pesei.
(...)
Seja como for, é mais fácil um fonometrista mediocremente treinado registrar no motodinamofone um maior número de sons, do que o mais hábil músico em tempo idêntico e com idêntico esforço. Por isso mesmo eu tanto escrevi.
O futuro pertence, pois, à filofonia.

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